review a mulher da casa abandonada

A Mulher da Casa Abandonada: do mistério à voz de Hilda

Do podcast ao documentário do Prime Video: o foco sai do mito e encontra a sobrevivente: Hilda Rosa dos Santos

Você conhece a história de Hilda Rosa dos Santos? Talvez o nome ainda não te soe familiar. Mas é bem provável que você lembre da Mulher da Casa Abandonada. Em 2022, o jornalista Chico Felitti lançou um podcast investigando aquela figura que intrigava os moradores de um bairro nobre de São Paulo: uma mulher de rosto pintado de branco, morando sozinha em um casarão em ruínas. O que começou como curiosidade virou um dos true crimes mais comentados do país. E, à medida em que as peças se encaixavam, a pergunta “quem é ela?” ganhava contornos dolorosos.

No centro do caso estão Margarida Bonetti e o ex-marido, René. Nos Estados Unidos, os dois foram acusados de manter uma mulher brasileira em situação análoga à escravidão por mais de 20 anos. Quando a denúncia veio à tona, no início dos anos 2000, Margarida voltou ao Brasil e se recolheu na casa da família. Enquanto a história explodia nas redes, a vítima — sem rosto, sem nome — seguia quase invisível para o público. Esse é o deslocamento que o novo documentário do Prime Video propõe: não repetir a lenda, mas responder perguntas e, sobretudo, devolver voz e dignidade a quem nunca teve: Hilda Rosa dos Santos.

A trajetória de Hilda é longa e injusta. Entregue ainda menina à família de Margarida — sim, doada —, ela cresceu sem certidão de nascimentosem conhecer os paissem família. A vida inteira se resumiu a servir. Ainda adolescente, passou a trabalhar em casa, viu o nascimento de Margarida e, anos depois, mudou-se com a família para os EUA. Lá, o que já era desigual virou prisão: passaporte confiscadonenhum salárionenhuma autonomiaSem falar inglêssem dinheirosem liberdade, Hilda passou mais de duas décadas em condições análogas à escravidão, adoeceu, sofreu abusos físicos e psicológicos, e perdeu anos de vida que ninguém devolve.

O ponto mais impactante, no entanto, é ouvir Hilda. Ela raramente se colocar como vítima. Talvez porque, até ali, ela nunca havia conhecido outra realidade. Essa percepção — a de que a violência pode ser naturalizada quando se nasce dentro dela — é tão cruel quanto tudo que lhe fizeram. E é justamente por isso que o documentário emociona quando escolhe o olhar manso e a fala calma de Hilda como eixo; quando nos apresenta os quadros que ela pinta hoje, com delicadeza, como se reorganizasse o mundo pela única linguagem que sempre lhe permitiram: a do silencioso.

capa do documentário a mulher da casa abandonada
capa do documentário a mulher da casa abandonada do Prime Video

Mulher da Casa Abandonada começou como uma história sobre quem era Margarida. Mas o que vemos agora é, antes de tudo, uma história sobre Hilda e, por extensão, sobre tantas outras Hildas que o Brasil insiste em não enxergar: mulheres podadas a vida inteira, a quem negaram dignidade repetidas vezes. Ao colocá-la no centro, o documentário  restaura algo básico: o direito de contar a sua própria versão.

O documentário, que tem três episódios, com  meia hora cada, resultado de um ano e meio de pesquisa, já disponível no Prime Video. É o tempo exato para escutar sem desviar o foco, para reconstituir sem espetacularizar e, principalmente, para lembrar que por trás de toda manchete existe uma pessoa: com nome, história, afeto e futuro.

No fim, fica a sensação de que, se o podcast abriu a porta, o documentário endireita a casa. E, desta vez, não estamos diante de um mistério urbano: estamos diante de Hilda.

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daniellacadavez@gmail.com

A Dani é a nossa Girl Boss e diretora na Legião dos Heróis. É Millennial com orgulho, fã de Star Wars, Disney, Jogos Vorazes, ficção científica e romances de época.

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