
De inspiração à frustração: como Rory mudou a forma como eu enxergo Gilmore Girls
Quando o sonho de perfeição cobra um preço e por que minha série de conforto ganhou um tom melancólico
Para muitas de nós, Gilmore Girls foi muito mais do que uma série. Eu mesma passei parte da adolescência acompanhando Rory e Lorelai, torcendo por cada conquista e me emocionando com cada desentendimento. Stars Hollow era quase uma segunda casa. E Rory… a minha inspiração. Sempre fui a aluna estudiosa, a engajada, a que sonhava com um futuro brilhante e me via refletida nela.
Os anos passaram e, principalmente depois do especial de 2016 (Gilmore Girls: Um Ano para Recordar), minha visão mudou. Rory deixou de ser inspiração e começou a me trazer uma melancolia. Me peguei pensando sobre o peso da perfeição colocado sobre ela desde o início e sobre como isso acabou cobrando um preço. Me vi questionando “o que deu errado para Rory?” e, junto, repensando o que chamamos de “sucesso”, especialmente para nós, millennials.
Sim, Rory não precisava de um diploma de Harvard ou Yale, de um Pulitzer, de uma carreira meteórica ou de qualquer outro indicador clássico de “sucesso” se ela estivesse feliz. Mas essa não era a realidade: ela não só não tinha alcançado nada do seu ideal como também não parecia feliz. Talvez a mensagem sempre esteve ali, sussurrada: o mundo real não recompensa apenas o “ser perfeita”; às vezes, a vida é mais complexa do que as nossas expectativas — e isso dói.

Na adolescência, as fases rebeldes faziam sentido como parte do amadurecimento. O que me abalou no revival foi perceber que, anos depois, Rory ainda estava presa no mesmo lugar. Em vez de evolução, havia estagnação. Foi ali que Gilmore Girls deixou de ser apenas uma série de conforto e ganhou, para mim, um tom melancólico. Não porque eu tenha “desgostado” da personagem, mas porque passei a enxergar o quanto é cruel carregar, por tanto tempo, a obrigação de ser exemplar e o quanto isso nos esvazia por dentro.
Essa reflexão mudou a minha relação com a série. Continuo amando o humor afiado, a cumplicidade mãe e filha, as referências, o aconchego de Stars Hollow. Mas, agora, também enxergo a Rory como um espelho das nossas contradições: o medo de decepcionar, a dificuldade de redefinir sonho e propósito, a armadilha de medir valor apenas por resultados visíveis. Talvez a pergunta nunca tenha sido “onde ela falhou?”, e sim “por que exigimos que ela nunca falhasse?”.
E, se você também tem essa história com Gilmore Girls, prepare o coração: a série vai ganhar um documentário especial pelos 25 anos. Segundo o The Hollywood Reporter, o projeto — intitulado Searching for Stars Hollow(“Procurando por Stars Hollow”, em tradução livre) — já está em produção e deve reunir entrevistas inéditas, bastidores e depoimentos, além de olhar para o impacto cultural da série ao longo de duas décadas e meia. Mal posso esperar para revisitar esse universo com a maturidade de agora e, quem sabe, encontrar novas respostas para as perguntas que Rory nos deixou.
Todas as temporadas de Gilmore Girls e o especial de 2016 estão disponíveis no catálogo da Netflix.
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